A cerimônia do Prêmio Jabuti foi marcada pela surpresa com o resultado da categoria Livro do Ano para À cidade, poemário publicado de forma independente por Mailson Furtado (foto), até então um desconhecido poeta do interior do Ceará.
Em seu discurso, Furtado afirmou querer que o prêmio servisse para que editoras passassem a olhar com mais atenção à produção feita longe dos grandes centros. Os comentários no rol do auditório do Ibirapuera, e que se estenderam pelos botecos noite adentro, iam da satisfação com o “tapa na cara do mercado”, até o velho despeito da raposa com as uvas.
“Premiaram até Chico Buarque”, ouvi na mesa ao lado de um editor — sem querer, juro — enquanto degustava a “melhor bisteca de São Paulo”. Pode? Até pode, mas…
Quem ainda ousa?
Qual dos leitores duvida que Mailson Furtado já tenha recebido várias propostas para publicar seus livros? Se Mailson não me desmentir em público, isso só comprovaria que o mercado não entendeu nada do recado dele no discurso. Não era um “me publiquem”, mas um singelo “leiam mais, ousem”. Quais das grandes editoras leem ainda? De verdade. Pedras em três, dois, um…
Iniciativas alternativas (re)inventam o mercado
O encontro Cartonera: releituras latino-americanas reuniu no Bom Retiro membros de 15 editoras cartoneras — que produzem livros com capas de papelão reutilizado — de cinco países diferentes. A Feira Miolo[s] — iniciativa Lote42 — se consolida como a mais importante do mercado independente — cerca de 200 participantes, público de 11 mil pessoas.
Ambos os eventos aconteceram na semana da entrega do Jabuti, que tende a sinalizar tendências do mercado. Claro que prêmios para as independentes são um alento, como o de contos para Enfim, imperatriz (Patuá), da Maria Fernanda Elias Maglio ou a HQ Angola Janga (Veneta), de Marcelo D’Salete. Mas ainda acho que vencem mais quando jogam com suas próprias regras, criam os próprios espaços, comem as próprias bistecas.
Texto publicado originalmente na coluna Mercado Editorial, do Suplemento Pernambuco, de 2018.
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