Não é novidade que as ditaduras nutrem pouca simpatia pela difusão de conhecimento. Simpatia por livros, só quando propagam o ideário do regime. Dessa forma, quando a bibliofobia se dissemina pela sociedade, estamos diante das trevas.
Há alguns meses, pais de alunos do Colégio Santo Agostinho, no Rio de Janeiro, pressionaram a direção a não adotar o livro Meninos sem pátria, de Luiz Puntel, porque falava sobre a ditadura — na verdade, o livro é inspirado na vida do jornalista José Maria Rabêlo, que, vejam só, foi perseguido pela ditadura civil-militar do Brasil. Já na Universidade de Brasília, livros sobre direitos humanos foram rasgados na biblioteca. Nem obras sobre artistas renascentistas escaparam da barbárie medieval. A história insiste, dolorosamente, em repetir-se.
EDITORAS PERSEGUIDAS
As ditaduras não perseguem livros, mas quem os produz. Por isso, a editora Civilização Brasileira foi uma das mais fustigadas pela ditadura no Brasil. O editor Ênio Silveira, filiado ao PCB, foi vítima de uma cruzada que minou as finanças da editora — atualmente um selo da Record, grupo abertamente controlado hoje por conservadores. Uma nova onda de autoritarismo repetirá esses eventos?
“VAI VENDO O CAIPORISMO”
Há alguns anos, em entrevista concedida ao Pernambuco nº 55, Gilvan Lemos revelou que, a pedido de Osman Lins, enviou seu Emissários do Diabo a Ênio Silveira. A obra foi publicada em junho de 1968, às vésperas do AI-5, quando Ênio acrescentaria outra prisão ao seu currículo.
Em 1970, um “incêndio misterioso” destruiu os escritórios da editora, que desde 1964 tivera suas linhas de crédito bloqueadas, por pressão dos militares. A partir dali, a situação econômica se degradaria até a editora ser comprada pelo BNDES em 1975, e absorvida em 1982 por grupos portugueses. Emissários do Diabo hoje faz parte do catálogo da Cepe Editora. Luta pela terra, judiciário corrupto e abuso policial estão no livro. Mais atual que nunca. Este mês a editora relança Espaço terrestre, de Gilvan. Resistiremos.
Texto publicado originalmente na coluna Mercado Editorial, do Suplemento Pernambuco, novembro de 2018.
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