Carolina Maria de Jesus, labirintos e baladas

Quando recebi o convite do Marcelino Freire de participar da Balada Literária deste ano dei alguns pulos após desligar o telefone. Já tinha participado da Balada em outras ocasiões, seja em mesas, recitais ou como público (melhor forma de participar da Balada!). Mas este ano tem um sabor especial: é que uma das homenageadas da Balada este ano é a Carolina Maria de Jesus. Você vai perguntar “Mas e daí?”. Eu digo que a obra de Carolina, “Quarto de despejo”, foi muito importante na construção do meu romance Estrangeiro no labirinto, lançado há quase um ano e que vem me dando muita alegria na recepção do público e da crítica.

Eu tive acesso a Carolina por uma segunda via: tinha lido sobre o romance “Push“, da autora americana Sapphire. O livro deu origem a um filme que concorreu ao Oscar, Preciosa, e essa acabou sendo a tradução para o português. Sem me alongar no enredo do livro, o importante é que, em uma entrevista, a autora havia mencionado Carolina Maria de Jesus como uma grande influência na construção da voz da personagem principal do romance, uma negra, obesa e que sofre todo tipo de abuso da mãe e do padastro. Sapphire registra a dicção da personagem como alguém que não é totalmente escolarizada, registrando, inclusive, desvios do inglês padrão.

Fiquei curioso e procurei “Quarto de Despejo” num sebo virtual. Fiquei encantado. A poética de Carolina, seu olhar sobre a realidade cheio de uma dureza sublime. Percebi que era o que faltava para a construção da voz da personagem da prostituta, do meu Estrangeiro no labirinto. Eu já havia escrito 60% das intervenções dessa personagem e decidi, lá pelo ano de 2010, rescrever tudo, usando essa poética truncada, essa sintaxe enviesada.

Carolina me fez perceber uma poética possível com essa voz marginalizada, muito embora minha proposta não fosse a reconstrução dessa voz, mas uma recriação até roseana mesmo de uma poética crua. Daí porque participar desta edição da Balada é super especial para mim. Minha mesa sobre edições alternativas é no dia 23, a partir das 14h, no b_arco Centro Cultural. Conversamos eu, Vanderley Mendonça (Demônio Negro), Eduardo Lacerda (Patuá), Berimba de Jesus (Edições Maloqueiristas) e Vitor Paes (Confraria do Vento). Vai ser bacana.

 

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