Há umas três semanas fui à feira de troca de livros do SESC. É um programa muito interessante, através do qual você troca um livro por um vale e pode trocar esse vale por outro livro da mesma categoria. A maioria dos livros que levei foram de literatura, então meus vales eram essencialmente desse tipo.
Chovia um pouco quando cheguei naquele sábado. Havia muita gente e imaginei de cara que já não ia encontrar nada. A maioria das pessoas procurava livros didáticos, então havia esperança.
O tabuleiro de literatura ficava do lado direito da quadra e algumas pessoas escolhiam seus livros, muitos procurando paradidáticos solicitados entre o cânone (Machado de Assis era procura certa). Um senhor estava esperando que seu neto escolhesse livros didáticos e, enquanto isso, deixava sua pilha de livros guardada. Entre os livros que estavam com ele, A Náusea, de Sartre. Pensei em pedir para trocar, mas desisti.
O começo de minha procura foi frustrante, pois não havia nada que interessasse. Depois notei que havia um fluxo e contrafluxo de troca: as pessoas levavam os livros e depois, ao encontrar algo mais interessante, devolviam. Fui notando que os livros que doara estavam lá. Nesse momento identifiquei meus dois livros, O diálogo das coisas e o [desvirtual provisório]. Algumas pessoas pegavam, olhavam a capa e devolviam ao tabuleiro. Confesso que era uma sensação estranha essa. Pensei se os livros tivessem espírito – e não têm? – o que sentiriam ao serem abandonados. O que sentiram os livros que doei? Estariam ansiosos por alguém que os quisesse?
Continuei procurando por livros e, vez ou outra, passava pelo lugar onde estavam meus, para saber se alguém os tinha levado. Uns quinze minutos depois, não estavam mais lá. Pensei: tem o contrafluxo, daqui a pouco voltam. Continuei garimpando e terminei, uns trinta minutos depois, com minha busca. Meus livros ainda não tinham voltado. Será que alguém decidiu efetivamente ficar com eles? Seria a mesma pessoa? Meus livros teriam sido a última opção? Isso significava quase nada e só alimentava meu ego tentar encontrar respostas positivas às perguntas.
Completei minha lista. Eis os livros:
Memórias em branco, John Upkide
Poemas selecionados, Joaquim Cardozo (seleção de César Leal)
Conversas no Café, Eduardo Maia et alli.
Em defesa do livro pernambucano, Jacques Ribemboim (org.)
Quem tem medo de vampiro?, Dalton Trevisan
A vida real, Fernando Sabino
Outros Orf’eus, Jomard Muniz de Brito
Ato final, Jailson Marroquim
Segui para a fila de troca. Sobravam vales. A funcionária do SESC disse que eu poderia deixar para outras pessoas. Uma garota que estava na fila, com os olhos brilhando, perguntou se eu não poderia dar para ela os vales sobrantes. Disse que sim. Ela pegou e saiu correndo, talvez para buscar os livros que gostaria de ter e não tinha conseguido por faltarem vales. Pensei: será que importava mesmo a ordem da escolha? Que livros ela pegaria que a tirariam do eixo? Será que meu livro tinha voltado ao tabuleiro?
Ignorei essa pergunta e saí. Caía uma garoa melancólica que molhava a sacola plástica dos livros órfãos que eu levava para casa.
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